quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Cracolândia: qual será o próximo passo para 'limpar' região?


Qual será o próximo passo dos governos estadual e municipal na Cracolândia, região central de São Paulo, para expulsar moradores e usuários de crack? Essa é a pergunta que ficou no ar na reunião extraordinária que aconteceu na tarde de hoje (18), na Câmara Municipal. Hoje, 15 dias depois do início da Operação Sufoco na região da Luz, centro da cidade, estabelecimentos e pensões foram lacrados e demolidos pela prefeitura, sem um comunicado prévio ao Ministério Público, à Defensoria ou, pelo menos, às famílias despejadas.


demolição cracolândia
Demolição de prédios na rua Helvétia, região da Cracolândia, em SP / foto: AE
Vereadores, órgãos públicos e entidades da sociedade civil estiveram presentes na atividade.

A prefeitura não foi localizada para comentar, por passar do horário comercial, mas um representante do município presente na reunião da Câmara disse que as ações foram tomadas por se tratar de uma área de interesse social, sem especificar o que será construído no local, e que muitos imóveis estavam irregulares, sem pagar o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) há muitos anos.

“Ora, mas como isso acontece assim de uma hora para outra. Por que então isso não foi feito antes? Por que somente agora e dessa maneira assim imediata foram demolidos? Se não apresentavam nenhuma condição de habitação, por que serviam de moradia para pessoas que inclusive recebiam auxilio aluguel da prefeitura”, questionou o promotor Mauricio Ribeiro Lopes, do Ministério Público Estadual, que abriu inquérito para apurar os fechamentos e demolições. “ Vemos muita sincronia da prefeitura com a especulação imobiliária”, completou.

Ele descartou a possibilidade de uma ação cautelar para impedir as demolições por falta de documentos que comprovem a regularidade dos imóveis e por causa do apelo social que está ganhando.

Vereadores que acompanharam, durante a manhã desta quarta-feira, o despejo de famílias que moravam nas pensões lamentaram o fato, como a vereadora Juliana Cardoso (PT). Já o vereador Ítalo Cardoso (PT), vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos e 1º secretário da Mesa Diretora da Câmara, falou sobre a falta de opção dos moradores que lá se encontravam.

“Incompreensivelmente começaram a demolir casas e famílias que nada têm a ver com o problema alegado para a intervenção foram levadas no mesmo movimento. Essas famílias não estão lá porque querem, mas porque não tem outra opção de vida”, criticou Ítalo Cardoso. 

Segundo Cardoso, “é sabido” que a Prefeitura tem interesses comerciais lá. “Antes de erguer edifício bonito e trazer cachorros para amedrontar as pessoas, temos que pensar que lá estão jovens que querem ajuda para serem inseridos de volta na sociedade. Esse problema não se resolve com polícia, é uma questão social”, completou.

A Defensoria Pública, também presente na reunião, intensificou sua atuação na região da Luz, colocando à disposição das pessoas em situação de rua psicólogos e assistentes sociais. “Já somamos 74 denúncias formuladas, algumas documentadas com fotos e testemunhas. Outras são relatos de moradores inconformados com a maneira como a operação é conduzida e até pessoas que participam da operação”, afirmou Carlos Weis, coordenador do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria de SP. 

“Com base nas denúncias, podemos perceber que não há desvio de conduta de um ou outro policial, mas que eles seguem orientações superiores na grande maioria dos casos”, afirmou Carlos Weis, que condenou as novas medidas tomadas na cracolândia, referindo-se às interdições e demolições de imóveis.

Lembrou que algumas conquistas foram alcançadas como o não uso de balas de borracha e gás lacrimogêneo, mas falou do fato da polícia conduzir os grupos de usuários pelas ruas da região. Ele comparou o movimento de tangenciar os grupos ao movimento dos peões que conduzem uma boiada. 

Ação federal

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, anunciou investimento de R$ 6,4 milhões para programas de tratamento de dependentes químicos na Cracolândia. Ele visitou a unidade de saúde para acolher e tratar usuários de drogas, que está sendo construída na Rua Prates. Padilha disse que as 16 equipes de saúde que atuam em São Paulo serão treinadas para atuarem como consultórios de rua, projeto do governo federal que oferece apoio ao usuário de drogas em seus ambiente de consumo.

Leon Garcia, da coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde, representante do ministro na reunião, disse que o ministério estuda com o município a possibilidade de com que algumas unidades dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) funcionem 24 horas. A estrutura de saúde da unidade na Rua Prates e o Caps no Jardim Ângela já foram escolhidos para funcionar dia e noite.

“Nosso trabalho se pauta essencialmente pela garantia e pela promoção de direitos dos cidadãos. Se não houver um trabalho coordenado entre as esferas de poder, vamos não só fracassar como criar problemas e situações que não gostaríamos de ter. Primeiro vamos adiantar recursos para os municípios que sofrem com o problema, para que alguns novos serviços sejam abertos. Em São Paulo, a indicação é para reforçar os centros de recolhimento”, disse Garcia.

Serão criadas dez residências terapêuticas em São Paulo até março deste ano. As estruturas são consideradas a última etapa do tratamento de dependentes químicos. Nelas, os usuários em recuperação partem para a reinserção social. São Paulo possui 1.200 leitos para internação psiquiátrica, que podem ser utilizados para tratamento de vício de drogas. Destas, 370 vagas são especializadas em tratamento contra dependência química.

O vereador Jamil Murad, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, lembrou que a solução adotada na cracolândia é eleitoreira e que é preciso esclarecer à população os métodos usados,que infringem os direitos humanos.

“Não podemos deixar que essa tragédia da dependência química seja manipulada ou usada de maneira leviana e como instrumento eleitoral. É um sério, não tem resultado imediato nem milagre, temos de ter paciência e persistência para continuar. Temos que ganhar a sociedade e as autoridades para essa política de respeito à população”, disse o vereador Jamil Murad (PCdoB), 
Segundo dados da Polícia Militar, até a manhã desta quarta já haviam sido realizadas 6.242 abordagens na região. Ao todo, foram detidas 157 pessoas, sendo que 43 eram procuradas pela Justiça e 62 kg de drogas foram apreendidos. Desse total, 15,1 kg de cocaína; 43,3 kg de maconha e 3,3 kg de crack.

da redação do Portal Vermelho, com informações da Câmara Municipal

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