Sem repressão, tráfico corre solto
Ricardo Araújo e Valdir Julião - Repórteres
O tráfico de drogas na área de boates, bares e restaurantes na Rua Manoel Augusto Bezerra de Araújo, conhecida como Rua do Salsa, em Ponta Negra, se mantem sem reservas e com um método já conhecido pela polícia: pastoradores de carros fazem o contato com os consumidores, intermedeiam a venda e se encarregam da entrega.
júnior santos
Delegado Luiz Lucena afirma que já prendeu 15 pessoas ligadas ao tráfico em Ponta Negra e continua com novas investigações
De acordo com informações de um espanhol que tem visto de turista no Brasil, a venda de drogas na região se inicia por volta das 0h30. Num português arranhado, ele disse: “Eu não tengo droga. Non gosto, non uso. Um amigo meu tem pó. Ele está vindo”. Neste momento, mais uma viatura da PM passa na frente dos bares, mas não para.
Na área externa, próximo ao estacionamento, com R$ 10 é possível adquirir uma pedra de crack. Um papelote de cocaína chega a custar R$ 50. Pelo transporte da drogas, os “aviões” cobram, em média, R$ 5.
Na noite da última quarta-feira, equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE negociou a compra de uma pedra de crack para comprovar a facilidade de acesso a entorpecentes no local. A droga foi devolvida ao 15º Distrito Policial, em Ponta Negra, juntamente com protocolo descrevendo todo o procedimentos. O produto e o documento foram entregues ao Delegado Luiz Lucena
Investigação
A Polícia não entra em detalhes para não prejudicar as investigações, mas o delegado da 15ª DP esclarece que a sua equipe “já vem realizando um trabalho” na chamada “rua do Salsa”, em Ponta Negra, para combater a prostituição e, principalmente, o tráfico de drogas, como cocaína e crack.
“Já prendemos umas 15 pessoas. Hoje (ontem) mesmo estava finalizando um inquérito policial sobre uma mulher que foi presa em flagrante delito traficando crack”, disse Luiz Lucena .
O delegado Lucena informou que a prisão da mulher, identificada como Emanuely Lima do Nascimento, ocorreu em 5 de março, portanto, dias antes da veiculação no programa “Fantástico”, da TV Globo, mostrando a prostituição e o tráfico de entorpecentes na rua Manoel Augusto Bezerra de Araújo.
Lucena explicou que essas prisões “durante um trabalho feito pela Polícia Civil e também pela Polícia Militar”. Ele mesmo disse que um agente de Polícia Civil, lotado na 15ª DP, passou 30 dias fora do expediente na delegacia, investigando o tráfico de drogas na área de Ponta Negra, primordialmente na “rua do Salsa”.
Ele informou, ainda, que elaborou um relatório e o enviou para o setor de inteligências das duas Policias, com a finalidade de identificar os fornecedores de drogas.
Estrangeiros lotam bares e boates
Ninfetas e mulheres exibindo corpos como mercadorias. Acesso à cocaína e ao crack mais fácil do que se imagina. Ausência de polícia e órgãos de combate ao crime e exploração sexual. Quatro dias após a veiculação de uma reportagem em cadeia nacional sobre a prostituição e tráfico de drogas em Natal, nada mudou.
A equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE visitou, no começo da madrugada de ontem, o complexo de bares na Rua Manoel Augusto Bezerra de Araújo, conhecida como Rua do Salsa, em Ponta Negra. Alheias à presença de uma equipe de reportagem, as garotas de programa se oferecem aos turistas às vistas de quem está ao redor. Estes, por sua vez, para aumentar o prazer do sexo, compram drogas e oxigenam o tráfico na região.
Constatou-se que, em conversas informais com frequentadores dos bares, que a partir de R$ 100 é possível “sair” com uma das meninas ou mulheres. Sim, há jovens a partir de 17 anos que frequentam o local em busca de clientes que pagam por sexo. Quem chega cedo ao complexo de lazer não percebe o comércio ilegal de drogas e a prostituição que ocorre sem nenhum pudor.
O fluxo de taxis trazendo turistas, exclusivamente homens a partir dos 20 anos para os bares, aumenta a partir das 23h. É como se tudo o que acontece tivesse horário pré-determinado. Minutos antes das 23h, um camburão da Polícia Militar passou em frente ao complexo, mas nenhum policial desceu do veículo.
Até à meia-noite, as prostitutas circulam entre as mesas, em busca do programa e do parceiro perfeito para aquela noite.
Os brasileiros não são muito bem-vindos. O que é confirmado quando elas reconhecem um e viram o rosto, como sinal de desinteresse. De acordo com Patrícia, quando as meninas identificam que o brasileiro, mesmo sendo turista, está interessado num programa, tentam descartá-lo.
“Você sabe né?! Brasileiro é bom de cama e adora pechincha. A gente trabalha mais na cama e ganha menos (risos). Nosso objetivo é pegar estrangeiro. Eles nem sempre transam, de tão bêbados que ficam”, comentou Patrícia.
Além das mulheres, inúmeros travestis frequentam o estabelecimento. Nas três horas em que a equipe de reportagem esteve no complexo de bares, 12 circulavam visualizando a movimentação no local.
A maioria se posiciona nos locais próximos aos estacionamentos. Muitos dos clientes preferem abordá-los na saída da festa. Outros iam embora e ouvia-se comentários de que a noite estava fraca.
Prostituta conta que polícia não interefe nem no tráfico
Timidamente, Patrícia se aproxima do possível cliente (o repórter) e revela o preço do seu trabalho: R$ 100.
Repórter – Tudo bem? E aí...
Patrícia – Tudo ótimo. Meu programa custa R$ 100. Faço quase tudo.
Repórter – Está disponível?
Patrícia – Sim. Mas vou sair com os dois? (pergunta olhando para outro membro da equipe de reportagem).
Repórter – Se você quiser, sim. Por quanto ficaria?
Patrícia – R$ 150.
Revelado o objetivo da conversa, Patrícia topa conversar com a equipe da TRIBUNA DO NORTE num espaço mais tranquilo. Para isso, recebeu R$ 30. A entrevista foi realizada dentro do veículo que conduzia a equipe. Mais relaxada e ciente de que nada seria feito, Patrícia contou em detalhes quando decidiu fazer programa e como funciona o comércio de mulheres no local.
“Uma amiga minha trabalha aqui há um certo tempo e me convidou. Eu estava desempregada, separada e não sabia como ia alimentar meus filhos e pagar o aluguel”, comentou Patrícia. Aos 27 anos, mãe de dois filhos (um de três e outro de oito anos) ela precisa fazer no mínimo seis programas mensais ao custo de R$ 150 cada, para pagar as despesas da família. Patrícia faz programas por conta própria, sem agenciadores.
O valor cobrado por ela, que está há quatro meses na “praça”, é abaixo da média das demais meninas, que chegam a cobrar até R$ 250 por duas horas. Segundo Patrícia, quando mais lábia e domínio de idiomas como o espanhol, italiano e inglês, melhor o pagamento. A língua menos falada dentro do complexo de bares é o português.
Repórter – Como você se comunica com seus clientes estrangeiros?
Patrícia - Como eu não sei outra língua, coloco o preço do programa no celular e mostro pro cliente gringo.
Repórter – Eles pagam numa boa?
Patrícia – Sim. Os brasileiros é que pedem pra gente baixar o valor.
Repórter – Você prioriza que tipo de homem para fazer programa?
Patrícia – Todas que estão aqui querem homens de fora do país. Eles pagam bem e não abusam da gente. Tem uns que pagam e dormem e a gente vai embora.
Repórter – A polícia interfere nesse comércio de drogas e sexo?
Patrícia – Desde que estou aqui, nunca.
Espanhol seria apenas o locador dos imóveis
O escritório Pinheiro & Schelb Advogados Associados, responsável pela defesa do empresário Salvador Costa Arostegui, afirma que ele não tem qualquer ligação com as atividades que apontam para a prática do “sexo turismo” e a trafico de drogas em uma das mais movimentadas áreas de Ponta Negra. Segundo os advogados Calliandro Pinheiro e José Majuli Bezerra Filho, “Salvador é apenas o locador dos imóveis” que formam o complexo de bares, restaurantes e boates na rua Dr. Manoel Augusto Bezerra de Araújo, mais conhecida como “rua do Salsa”.
“Nosso cliente apenas loca os quiosques e pontos comerciais. Os locatários é que têm responsabilidade sobre as atividades ali desenvolvidas”, disse Calliandro Pinheiro, em visita à redação da TRIBUNA DO NORTE.
Outro ponto levantado pelos advogados foi a menção do nome de Marcus Gadelha, que segundo informações colhidas no local, seria o administrador do complexo. José Majuli Bezerra Filho afirma que o citado é, na realidade, funcionário do escritório Pinheiro & Schelb Advogados Associados. “Ele está encarregado de inventariar e fiscalizar os imóveis e tem desenvolvido um trabalho no sentido de manter incólume o patrimônio do nosso cliente Salvador Arostegui”, disse.
Para finalizar os advogados garantem que as imagens divulgadas na matéria do programa Fantástico, da Rede Globo, não foram realizadas no bar Extravasa e sim no bar Bora Bora, integrante da Praça O Jardim.
Acompanhe alguns pontos da nota emitida pelos advogados do empresário:
- Os imóveis em questão pertencem ao Sr. Salvador Costa Arostegui, mas encontram-se locados a terceiros e que o Sr. Salvador não faz parte da administração de nenhum deles;
- Há mais de 02 anos o Sr. Salvador não vem ao Brasil, sendo certo que não possui qualquer vinculação com as atividades comerciais praticadas em seus imóveis;
- Quanto as atividades comerciais desenvolvidas nos bens de propriedade do Sr. Salvador Costa Arostegui, importa esclarecer que a própria Justiça Federal já as declarou lícitas, autorizando-o a continuar explorando e recebendo os alugueis de seus imóveis, já que não houve expropriação de suas propriedades;
- Devido a notória falta de segurança em todo o bairro de Ponta Negra e não só no complexo em questão, em setembro de 2010, foi enviado ofício às autoridades públicas solicitando providencias no sentido de inibir a venda de drogas e a prostituição nos arredores do centro comercial;
CNJ - Juízes fiscalizam exploração
Uma equipe composta pelos juízes auxiliares Nicolau Lupianhes, Agamenilde Dantas e José Antônio de Paula Santos Neto, além do assessor Sílvio Marques Neto e mais quatro servidores da Corregedoria Nacional do Conselho Nacional de Justiça-CNJ, está visitando o Rio Grande do Norte desde essa terça-feira com o objetivo de verificar o cumprimento das determinações feitas pelo órgão ao Tribunal de Justiça do RN na inspeção promovida em fevereiro passado.
Durante a visita, que vai até amanhã, os juízes auxiliares também estão levantando as medidas que estão sendo tomadas pelo Tribunal de Justiça para garantir a dignidade das crianças e dos adolescentes e combater a exploração sexual de menores. A revisão da inspeção está sendo feita em unidades de primeiro e segundo graus da justiça comum estadual.
Ao ser indagado sobre o caso das crianças colocadas em situação de risco em Ponta Negra e exibido em mídia nacional, o juiz descreveu como uma situação trágica que não é “privilégio” apenas do Rio Grande do Norte ou de Natal, mas que o Brasil inteiro sofre com isso. Porém, ele esclareceu que todos estão trabalhando muito para combater o problema. Um grande exemplo citado por ele é o trabalho desenvolvido pelo juiz José Dantas de Paiva, da 1ª Vara da Infância e Juventude de Natal.
Em entrevista, Nicolau Lupianhes informou que o trabalho da equipe no momento é o de colher dados, checar se as recomendações do relatório da inspeção estão sendo cumpridas, como adoção de políticas públicas por parte das varas da infância e juventude, por exemplo.
Fonte: Tribuna do Norte
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